segunda-feira, 9 de abril de 2007

Sr.Dr.;Sr.Eng.;Sr.Arq.


No mundo, só em Portugal os diplomados pela universidade são tratados por doutor ou engenheiro. Em França Docteur significa médico, em mais parte nenhuma do mundo civilizado as pessoas são tratadas pelos títulos académicos.

Este tratamento português é um atavismo cultural e um arcaísmo medieval relacionado com o analfabetismo da massa. Tem relação com o sistema arcaico de classes ele sucede aos títulos de nobreza ou do senhorialismo. Ser Sr. Dr. Ou Sr. Eng. é diferenciar uma casta. É um tipo de ascensão social fictícia, não económica porque não representa um status económico. É um tratamento pré moderno porque na modernidade são o saber e o estatuto económico que distinguem os indivíduos.

O tratamento perpetua a ignorância de massa. Pressupõe o desejo de a massa não ascender aos saberes, segrega os que não são “credenciados” ou autorizados no saber, por um lado, e os “credenciados” por outro. Por isso é que Portugal – o único pais onde existem estes tratamentos - é o mais iletrado da Europa, o mais pobre, com mais desnivelamento social e, curiosamente onde há menos licenciados.

Ps. todo o comentário bem disposto e elevado é bem vindo.

19 comentários:

Lúcia Duarte disse...

ainda bem que os meus amigos "doutores" não são nada pretenciosos quanto ao titulo...
acho que escolhi bem os meus amigos porque eles, embora eu não seja licenciada, nem doutora, tratam-me como um ser humano válido e respeitam-meObrigado, amigos!

Anónimo disse...

Foi o Mattoso (sem Prof.), ná Idenidade Nacional, que explicou o fenómeno da pequenez (em número) das nossas elites políticas e económicas. Quanto à doutorice, usando os conhecimentos disponíveis, pode dizer-se o seguinte: em Portugal os doutores não se formam: nascem. E se alguém que se diz doutor conviver com o povo, se se aproximar do povo em demasia, então é o próprio povo o primeiro a duvidar do título académico. Dizendo: que raio de doutor é este gajo, pá? Da mula russa está-se mesmo a ver! Portugal não é uma nação no sentido exacto do termo; é antes uma região psicologicamente afectada do universo incapaz de ter uma consciência de si própria. Portugal só é nação quando se morre ou quando se abandona. Mal nosso este, triste fado, o de aqui irmos permanecendo...

Jorge de Sena e Alberto Pimenta resumem tudo o que importa saber sobre esta região.

A. João Soares disse...

Caro Sr. Dr.
É para mim uma grande honra poder escrever um pequeno comentário neste seu espaço. A minha humildade como ficou expresso no post em Do Mirante, em 28 de Março com o título «Elogio ao Governo» http://joaobarbeita.blogspot.com/2007/03/elogio-ao-governo.html
é um facto que não me diminui !!!!
As amizades virtuais têm a virtude de ultrapassar essas diferenças de classe. Estamos a confrontar ideias e não carros, roupas, ténis, tipo de telemóvel, etc.
Para nosso mal, não usamos a língua inglesa em que o You tanto quer dizer tu como você.
Bom texto. Presenteie-nos com muitos outros do género.
Um abraço
A. João Soares

papagueno disse...

Realmente nunca percebi porque é que nunca acabaram com esta treta dos títulos académicos. Conheço muitos que fazem mesmo questão em humilhar os seus empregados obrigando-os a trataren-nos por Sr. Doutor.

Anónimo disse...

Concordo inteiramente com esta análise. Os títulos académicos em Portugal criam uma distinção de classe social completamente fictícia. Não admira, por isso, que os detentores de cargos públicos façam tanta questão em ostentar esses "títulos". Sendo assim, não nos deve surpreender que a recente polémica em torno da (não?) licenciatura do primeiro-ministro tenha ocupado tanto espaço nos media... Os "doutores", e só eles, é que ficam habilitados a ocupar o poder. Tudo o resto não passa de desprezível arraia-miúda!

Anónimo disse...

Querido Jorge,
Gostei imenso da tua postagem e tratas o tema de uma maneira que me fez mesmo muita graça. Mas é exactamente isso. Vejo às vezes chamar Doutor aqui em Portugal até aos treinadores das equipas de futebol. Sao doutores "es" em qué? em pontapés.
Gosto da tua estrutura de pensamento cartesiana, devido à tua segunda cultura: francesa.
Espero que continues a nos deleitar com as tuas postagens.
Beijinhos
Ema Pires

Anónimo disse...

Aqui me vas a disculpar pero somos lo que somos y cada cultura con es una...
Aqui estoy...en medio de dos...
Apesar de hijo del Pueblo... luché...
Pero soy el mismo...
Viva la Libertad

Anónimo disse...

Papagueno, vais-me desculpar mas somos o que somos.
E isso não impede que estejamos junto do Povo... E tu sabes disso muito bem, me conheces...

ANTONIO DELGADO disse...

Para o português parece ser indigno trabalhar com as mãos porque é sinónimo de gente chã ou sem qualificação. São muitas a frases do linguarejar popular que atestam essa ideia “ trabalhar é bom para o preto” , “trabalha que nem um galego”, “que nem um moiro”, é um “escravo do trabalho”, “ se trabalhar da saúde que trabalhem os doentes” a colecção destas vozes são muitas. A necessidade de limpeza de sangue que se manifesta na titulitis e é um aspecto bem característico da mentalidade portuguesa. Não há quase ninguém que não seja Sr. Dr., Sr. Presidente de qualquer coisa, Sr. Eng. Ou sr. arquitecto. Como se o título desse dignidade a alguém ou fizesse um bom profissional profissional ou alguém honrado. Veja-se o caso do presidente da câmara de Alcobaça um tal Sapinho que segundo os jornais nem os impostos declara em sete anos ao TC como é obrigado por lei. No entanto, além de mau presidente ainda foge à legalidade e infestou o concelho de Alcobaça, com placas a branquear as suas “virtudes” escrevendo sempre inaugurado pelo Dr. Sapinho..etc.
Mas a psicose nacional sobre títulos é de tal ordem que nos últimos dias tem gerado uma outra que é saber se José Sócrates é ou não é diplomado em engenharia. Certos jornalistas, jornais, televisões, blogs fazem eco deste delírio que para mim é um verdadeiro retrato do estado patológico de demência ancestral que afecta a mentalidade portuguesa. Para o cidadão português não lhe interessa questionar a corrupção existente em todos os sectores da vida política social e cultural da nossa sociedade, nem questionar se os portugueses vivem bem ou se são felizes. Interessa é o diploma de um político que eventualmente se terá formado numa universidade que governos de oposição ao partido socialista autorizou e nunca quiseram fiscalizar funcionamentos menos claros... É curioso este Povo (extracto do mue comentário na postagem anterior)

Anónimo disse...

Titulos, que me importam os titulos... mas nunca poderei negar a minha academia...
Sou fiel a tudo, mas o povo primeiro!
Por esses estou...

papagueno disse...

Ludovicus, desculpa se generalizei. Também é verdade que conheço muita gente suficientemente humilde que nem gosta de tratamentos desses, entre eles alguns amigos como tu. No entanto não deixa de ser verdade o que digo pois há sempre alguns que se julgam superiores só por terem um canudo. Esses fazem questão de nos corrigir: "Senhor não, Doutor!"
Um abraço

Anónimo disse...

Meu caro Jorge Casal,

Compreendo as motivações da sua crónica, pois há aspectos sociais complexos decorrentes do sistema social vigente e há muita gente que se arroga títulos e competências que não possui.

O exemplo que refere é, aliás, paradigma do erro: os médicos que, em França e Portugal, são tratados por "docteur" são, na sua grande maioria, meros licenciados, sem doutoramento. Quando se fala em castas, há que atender à ascendência de umas sobre outras.

Porém, lamento dizer-lhe, Portugal não é o único país a hierarquizar a sociedade em função das habilitações, quase todos o fazem. Julgo mesmo que seria mais sadio diferenciar-se por esse critério do que pelo sangue ou pela pretença à casta bramânica, como sucede.

Na Alemanha, por exemplo, é frequente denominar-se alguém com o prefixo da profissão que exerce como sinal de cortesia. O problema, em Portugal, está na falta de cortesia ou, se preferir, na falta de consideração pelo indivíduo, seja ele dr., sr., eng., arq., etc. Este aspecto torna-se, no entanto, cada vez mais absurdo porque o grau académico não corresponde de facto a qualquer diferenciação real. Veja-se, por exemplo, a quantidade de licenciados a exercerem a função de "caixas" de hipermercado.

O horror generalizado ao trabalho estabelece ainda outro tipo de ínvias valorações simbólicas.

Cumprimentos,

Francisco Paiva

Jorge Casal disse...

Este tema do tratamento por dr., eng. ou arq. dava pano para mangas.

Ortogal cita Matoso para falar da «pequenez» (quantitativa) das elites portuguesas. Mas há que ver também a pequenez «qualitativa» das mesmas. São elites de «paróquia», duma aldeia grande que se chama Portugal, de vistas curtas, pouco cosmopolitas e ignorantes no que toca a assuntos fora da sua área. Por isso aspiram a que os seus filhos sejam tratados por Sr. Dr., para os distanciar da massa amorfa que é esta grande aldeia. Diz que o povo suspeita dos doutores que se aproximam dele («que raio de doutor é este?»). É verdade, mas, aqui, distingo: essa atitude é sobretudo dos que se tomam por «classe elevada», as tais elites de província; estas exigem que o «sr. dr.» se coloque «no seu lugar», isto é, do lado dos «grandes». Contrariamente, as camadas modestas da população, essas, sentem-se «muito honradas» de ter um «sr. dr.» como interlocutor ou que cumprimente os passantes. Todavia, um caso como o outro são duas facetas da mesma ruralidade provinciana e mesquinha, atenta a efeitos exteriores em que conta mais a aparência do que a interioridade.

Papapequeno tem razão em referir os «chefes de Repartição» que exigem, humilhantemente» que os seus subordinados os tratem por Sr Dr. (que nem o são na maior parte dos casos).

O comentário do António Delgado sobre «trabalho sujo e limpo» (a actividade do sr. dr. é «limpa» ou pode até não se dizer «trabalho») dava várias teses de doutoramento… das verdadeiras! Talvez um dia aborde a questão (se ele não o fizer antes…).

Francisco Paiva considera «mais sadio» o tratamento por dr do que pela casta ou pelo sangue. E os franceses que são todos (do chefe do Estado ao porteiro da fábrica) Mr ou Mme?, e os ingleses, ou americanos, ou suecos… Que os alemães usem o «prefixo da profissão que exercem como sinal de cortesia», é um costume dos salões e, como diz bem, de «cortesia». Não são tratamentos identitários públicos. É evidente que numa empresa onde há muitas profissões (ou num salão da burguesia selecta) as pessoas sejam tratadas pela sua profissão: uns são doutores (economistas…), outros engenheiros, outros arquitectos. Mas não são tratamentos públicos de identidade como entre nós. Vejam nos jornais como eles nomeiam os políticos, cientistas ou figuras públicas: pelo nome exclusivamente precedido, eventualmente, de Senhor ou Senhora.
jogecasal

a.castro disse...

Terminou há minutos a entrevista na RTP1 ao "Sócrates 3". Como seria de esperar, tentou dar uma "ensaboadela" na cabeça dos portugueses! :(
Abraço!

Anónimo disse...

Meus Caros Amigos

Sou pouco dado a teorias da conspiração, no entanto, depois de ouvir os comentários à entrevista do Primeiro-Ministro à pouco na RTP1 sou tentado a pensar que há, de facto, um ataque ao primeiro-ministro (mais um) com o propósito de atingir o Partido Socialista e o governo. Na realidade só assim podemos concluir depois de ouvir todas as explicações dadas pelo Engº José Sócrates, nosso Primeiro-ministro e secretário-geral do Partido Socialista. Pessoalmente, nunca tive dúvidas sobre a lisura do seu percurso académico e, se dúvidas ainda houvesse, ficaram todas cabalmente esclarecidas nesta entrevista.
Um percurso académico longo, seis anos e meio em engenharia (quando hoje com o processo de bolonha dava para fazer duas licenciaturas ou uma licenciatura e um mestrado) e um MBA, demonstrativos, ambos, de uma vontade crescente de se valorizar intelectualmente e de se qualificar profissionalmente.
Para além disso, demonstrou que não beneficiou de qualquer tipo de favorecimento, prebenda ou laxismo na conclusão do seu percurso escolar.
Respondeu a tudo sempre de forma clara e clarificadora!
Muitos de nós enquanto cidadãos responsáveis, nos questionámos, justamente, face ao conjunto de insinuações, mentiras e relações causais de factos desconexos que não eram possíveis de provar, mas que foram contribuindo para minar a credibilidade do Primeiro-Ministro de Portugal, temos agora o dever de lhe retribuirmos a homenagem de que é penhor a sua seriedade e honestidade política e pessoal.
Um abraço a todos.
Viva a República.

Anónimo disse...

Obviamente que definir alguém por doutor sem sê-lo é ridiculo!!
Por outro lado se uma determinada pessoa obteve um titulo academico na minha opinião qual é o inconveniente em tratar a dita pessoa pelo devido título.
Doutores são os doutorados e não meros licenciados e esta designação é que esta mal interpretada actualmente.
Na minha opinião um licenciado em medicina é médico e não doutor, como disse anteriormente!Para um licenciado em medicina ser tratado por doutor terá que realizar um doutoramento.
Isto parece-me obvio!

Ernesto Feliciano disse...

Caro Jorge,

É um problema de natureza cultural.
E que começam logo nas escolas com as designações de “stor” ou “store”.
E depois ainda há os que não sendo licenciados, se fazem passar por tal…

Anónimo disse...

O que é triste, muito triste, é que os títulos, ou os pseudo-títulos, assumam importância interior capital, mesmo para aqueles que, muitas vezes, publica ou privadamente, os renegam.
São as contradições do ser humano...São os interesses ao sabor do vento que passa...
Cá por mim prefiro ser EU, simples, humilde, mulher da minha aldeia, "saloia" (na linguagem dos mais ignorantes e pretensiosos...)mulher do povo, Amiga, Companheira.
Enfim, uma infinidade de títulos...

Anónimo disse...

Gostei do texto .
Concordo plenamente, em Portugal infelizmente basta pronunciar a palavra "universidade",
já é Dr...
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