Quem não se lembra desta célebre frase de Vasco Santana (Narciso) para António Silva (Evaristo) no filme português “O Pátio das Cantigas” de 1942 realizado por Francisco Ribeiro (Ribeirinho)
O Narciso e o Evaristo eram donos de lojas de pequeno comércio de bairro, com dois dos mais tradicionais ramos de negócio da época, uma leitaria e uma mercearia que, como tantas outras, povoavam este País de Norte a Sul. Muitos outros ramos de negócio se espalhavam pelos bairros das cidades, vilas e aldeias. O pequeno comércio, era o suporte de muitas famílias e ainda hoje algum vai resistindo a uma morte lenta anunciada.
Alguns destes ramos foram deixando de ter razão de continuar, por força de um desenvolvimento tecnológico que os foi substituindo por outros que se foram mostrando mais adequados á época. Dou como exemplo os inúmeros carvoeiro que em tempos não muito remotos foram resistindo mas que hoje desapareceram por completo, pelo menos nas grandes urbes.
Outros existiam servindo toda uma população que deles se utilizava quer por necessidade, quer pela proximidade da residência de cada um. Drogarias, açougues, padarias, retrosarias, pronto a vestir, têxteis lar, sapatarias, tantos ramos tradicionais que iam satisfazendo as necessidades do consumidor.
Foram tempos que acabaram. O pequeno comércio vive hoje em perfeita agonia, e muitos vão encerrando, lentamente com toda a carga negativa daí resultante.
São as grandes superfícies comerciais, a razão desta morte lenta na maioria dos casos. Em nome do progresso, muitas injustiças se foram criando, e obrigando a este estado de coisas.
Que leis protegeram o pequeno comerciante? Que condições de sobrevivência lhes foram dadas? Que contrapartidas?
O Procom – Programa de Incentivo à Modernização do Comércio,? A Urbcom – Sistema de Incentivos a Projectos de Urbanismo Comercial?
Modernizar? Claro é imperioso e necessário. Que capacidade têm os pequenos comerciantes perante a desigualdade da concorrência destes grandes espaços comerciais? Que preços para competir? É que comprar com tostões não é o mesmo que comprar com milhões e desde logo se criou uma barreira intransponível que o pequeno comércio não consegue nem encontra meios para ultrapassar.
Até nos horários a profunda injustiça que se criou marca a diferença pela negativa. Modernizar sim, mas não a qualquer preço.
Sei do que falo! Também senti na pele todas estas injustiças em nome do progresso e do interesse público, porque fui um pequeno comerciante da baixa lisboeta.
A nós, pequenos comerciantes, quem nos valeu? Quem nos vale? Ninguém.
Em Portugal, neste momento são já mais de 1.500 as grandes superfícies ou unidades comerciais de dimensão relevante, propriedade de grandes grupos. Os Centros Comerciais são mais de 30.000 espalhados por todo o País. Nos dois casos, acrescerá os que estão em fase de apreciação ou já aprovados para serem implantados.
Quem consegue competir com estes “monstros” que em nome do progresso e da comodidade nos vão aparecendo a cada esquina?
E os postos de trabalho, dirão alguns, eu sei. Mas será que esse facto impede quem tem o poder de legislar de se lembrar do pequeno comerciante?
As questões climatéricas e/ou as grandes catástrofes naturais sempre foram motivo para se reclamarem subsídios para as diversas actividades afectadas por esses factos. Os pescadores, logo que o mar o não permite, não saem em busca do seu ganha pão e solicitam-nos. Os agricultores, quando as suas culturas não resultam por factores climatéricos, reclamam-nos quase de imediato. E com inteira justiça, não contesto, ninguém contesta.
E o pequeno comerciante? Que subsídios, que ajudas?
É bom que haja progresso! Mas, não pode ser em seu nome que se cometam injustiças, nem obrigar o pequeno comerciante a pagar a factura desse progresso.
Comércio tradicional que futuro?